Governo Lula é acusado de “hipocrisia ambiental” após desmatar para construir estrada da COP30 na Amazônia
- Oeste MT Urgente
- 15 de nov.
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Belém (PA) — A preparação do Brasil para sediar a COP30, a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas marcada para novembro de 2025 em Belém, reacendeu um debate espinhoso: o governo federal estaria repetindo práticas que a própria conferência busca combater? Para ambientalistas, moradores e pesquisadores, a resposta passa pelo impacto da nova estrada construída para escoar o fluxo de participantes do evento, obra que implicou o desmatamento de mais de 13 quilômetros de floresta amazônica.
A rodovia, planejada para melhorar o acesso à capital paraense durante a conferência — que deve reunir cerca de 50 mil visitantes, entre chefes de Estado, especialistas, delegações internacionais e organizações civis — se tornou o epicentro de críticas que apontam contradição, incoerência e hipocrisia ambiental.
Desmatamento para receber um evento contra o desmatamento
A estrada de quatro faixas corta áreas de vegetação tropical densa, com zonas úmidas e habitats essenciais para aves, pequenos mamíferos e espécies endêmicas. Segundo moradores da região, o desmate ocorreu de forma acelerada, com máquinas trabalhando dia e noite para que a via ficasse pronta a tempo da conferência.
Para movimentos ambientais, o simbolismo negativo fala mais alto que qualquer justificativa logística.
“É surreal. Para realizar um evento sobre preservação, o governo destrói a própria floresta que tenta defender. É a antítese da COP”, disse um dos ativistas que acompanha o caso.
Pesquisadores ressaltam que o impacto não se limita ao corte de árvores: áreas de brejo e matas de várzea, fundamentais para a dinâmica hídrica local, também foram alteradas. Fragmentação de habitats, alteração da fauna e risco de expansão urbana não planejada são apontados como efeitos colaterais.
Moradores sentem impacto direto: perda de renda e medo de expulsão
A poucos metros da estrada vive Cláudio Verequete, morador que tirava da floresta sua principal fonte de renda: o açaí.
Com o corte das árvores, ele viu sua subsistência desaparecer.
“Tudo foi derrubado. A colheita que a gente fazia para sobreviver simplesmente acabou. Agora não temos mais renda”, lamenta.
O medo da pressão imobiliária é outro ponto sensível:
“Nossa preocupação é que depois da estrada venha posto, galpão, comércio… e aí digam que precisamos ir embora. A terra pode virar mercadoria”, afirma.
Casos semelhantes já ocorreram em regiões próximas a grandes obras públicas no Pará, o que aumenta a apreensão de famílias tradicionais.
Silêncio das instituições e críticas crescentes
Até o momento, organizações ambientais de grande expressão nacional não emitiram notas oficiais. No entanto, grupos independentes e coletivos da sociedade civil vêm denunciando o que chamam de “greenwashing estatal” — a prática de promover discurso ambientalista enquanto se executam ações contrárias à preservação.
Para esses grupos, a construção da rodovia torna simbólica a falta de alinhamento entre o discurso internacional e a prática interna:
“A Amazônia não deveria ser tratada como ‘cenário’ para receber autoridades. Ela deveria ser protegida todos os dias, principalmente quando o assunto é clima”, afirma um pesquisador ouvido pela reportagem.
COP30 e os riscos de imagem para o Brasil
Analistas ponderam que a controvérsia pode respingar diretamente na reputação do país durante a conferência. O Brasil vinha apostando na COP30 como oportunidade estratégica para reafirmar o papel de liderança global no debate ambiental.
Porém, o episódio da estrada tende a fortalecer discursos críticos:
descompasso entre promessas e prática ambiental;
falta de planejamento sustentável nas obras;
impactos sociais negligenciados na pressa de preparar o evento.
Para especialistas em políticas ambientais, o caso poderá ser usado como exemplo de que até governos que defendem a pauta climática podem ceder a pressões logísticas e econômicas sem mensurar impactos de longo prazo.
O episódio da estrada construída para a COP30 se transformou em um símbolo controverso. Enquanto o governo federal defende a necessidade da obra para receber um evento de escala mundial, moradores e ativistas denunciam um paradoxo difícil de ignorar: como sediar uma conferência contra o desmatamento produzindo desmatamento?
A resposta — política, ambiental e ética — pode definir não apenas a imagem do Brasil na COP30, mas também a credibilidade das promessas de preservação da Amazônia nos próximos anos.



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